E(Foto: Digus.com.br)uarta-feira, e o autódromo de Brasília começa a receber gente assim que a noite cai na cidade. Os carros estilizados brotam no meio da pista: a Caravan Anaconda, o Skyline 34, a Suprema Monster, e Chevette, e Parati, e Gol, e um punhado de carros, tunados ou rebaixados, realizam uma série de manobras e desfiles que queimam o asfalto e por vezes se assemelham a espetáculos pirotécnicos. Em menor escala, as motos também participam do show. Do Quarta Show, um evento mensal que enche a arquibancada da reta principal e sacia os mais de 8 mil aficionados por velocidade e adrenalina.
Mas por algum tempo, o Quarta Show ficou de fora do calendário esportivo – por assim dizer – da pista do DF. O som pesado das carangas misturou-se ao do rap e do funk e trouxe os exageros. Mulheres peladas, drogas e sexo explícito levaram a um período de inatividade para um espaço que a Derson Racing, de Anderson Marques, organizador do evento, queria para que "a juventude de Brasília se manifeste e mostre o que eles gostam de fazer".
O Quarta Show só voltou à ação no início deste semestre depois que um trabalho de bastidores fosse realizado. O Subsecretário de Administração dos Espaços Esportivos, Léo Vivas (PRB-RJ), foi convencido a permiti-lo novamente graças à interseção partiu de Carlos Augusto Senise, presidente da FMDF – a Federação de Motociclismo local. "Saiu um filme de uma menina na internet dançando em cima de um carro, e o secretário, que é de uma igreja, achou que aquilo ali não condizia com o comportamento dentro de uma área esportiva. E suspendeu até que fosse explicado", alega Senise à REVISTA WARM UP.
Derson diz que tudo está dentro dos padrões, sobretudo de segurança, para evitar novos contratempos. "Tem o corpo de bombeiros e autoridades competentes acompanhando tudo", explica à RWUp, que menciona "oito brigadas de incêndio, uma ambulância UTI com médico e paramédico, 60 seguranças, que portam detectores de metais". "Tudo é monitorado por câmeras posicionadas em locais estratégicos", acrescenta.
O organizador também garante que não são causados danos à estrutura já precária do antigo complexo de quase 40 anos. "Quando a gestão do autódromo era do Nelson Piquet, eu quis fazer um show de manobras e tive de fazer uma apresentação para ele para provar que o pneu, quando frita, não é prejudicial, se tiver com rodas de alumínio", conta Derson. "São as rodas de aço que 'comem' o asfalto, as de alumínio 'escorregam' e se desgastam. Os pilotos só usam dessas para fazer as apresentações. Já fizemos alguns testes e nunca tivemos problemas, tanto que hoje os caminhões da F-Truck, muito mais pesados que os nossos carros, fazem esses shows, não só em Brasília, como por todo o país."
Olhando por aí, o Quarta Show parece ser um evento normal. Mas como grande parte das coisas que acontecem no entorno do autódromo, há seus sobressaltos. Tudo no evento é cobrado: homens pagam R$ 20 e mulheres, R$ 10; o estacionamento custa R$ 50, e os expositores têm de desembolsar R$ 50 – os valores estão disponíveis no perfil da página no Facebook, assim como as imagens e os vídeos das apresentações. A natureza do Quarta Show se encaixaria perfeitamente como um evento regional esportivo, segundo a tabela de uso do autódromo decretada em 2008 em Diário Oficial. Só que acaba sendo tratada como evento sem fins lucrativos.
O que muda? Em vez de R$ 2.500, eram repassados à Secretaria do Governo Federal R$ 300 até agosto, mês em que a tabela sofreu um reajuste. Com a atualização, seriam R$ 3 mil pelo uso diário, mas só R$ 700 cai nos cofres do governo, segundo o próprio Derson, que diz gastar cerca de R$ 30 mil por cada evento às quartas de cada mês.
Conforme aparece também no DO, o termo de autorização para realização da Quarta Show é assinado por Francinete Morais da Silva, presidenta do Brasilia Motor Clube, caracterizando a natureza de um evento de carros. Curiosamente, quem aparece como um dos sócios-fundadores do BMC é Carlos Senise, o presidente da entidade de motociclismo que intercedeu à favor da volta do Quarta Show.
Fontes colocam Senise como o mentor do evento e afirmam que a federação local ocupa uma sala no autódromo de Brasília que "permanece sempre fechada, abrindo somente quando ocorre o Quarta Show. "Isso por si só causa uma grande estranheza, pois é um evento de manobras de carros realizado por um presidente de federação de motos", indica uma testemunha ouvida pela RWUp.Embora o custo diário da locação para um evento esportivo nacional era de R$ 7 mil, Senise continuou pagando ao governo os mesmos R$ 300 por um campeonato reconhecido pela CBMA prática de repasse de mínimo de taxas pela classificação 'sem fins lucrativos' se estende para os eventos administrados pela FMDF, mesmo àqueles que têm a chancela de caráter nacional – os mais caros segundo a distinção de preços. Foi o que aconteceu com a Moto 1000 GP em 2012.
Embora a tabela de custos do GDF válida à época explicitasse que o custo diário da locação para um evento esportivo nacional era de R$ 7 mil, Senise continuou pagando ao governo os mesmos R$ 300 por um campeonato reconhecido pela CBM (Confederação Brasileira de Motociclismo) como o campeonato brasileiro da modalidade. "A Moto 1000 GP é uma empresa organizadora de um campeonato que obviamente tem fins lucrativos", rebate o gestor Gilson Scudeler à RWUp.
A RWUp teve acesso ao documento que discrimina os preços referentes à passagem da Moto 1000 GP por Brasília, tendo como evento suporte o campeonato local. Gilson ri quando soube que somente R$ 1.050,00 foram pagos ao GDF referentes aos dias em que seu certame esteve na capital federal. "Paguei muito mais do que isso..."A tabela do Governo do DF estabelece que a diária do evento nacional custa R$ 7 mil pelo uso do autódromo (R$ 14 mil pelos dois dias de evento). Mas só R$ 300 (de uma diária) foram repassados à Secretaria do Esporte do DF.A reserva do autódromo foi feita com a intermediação da FMDF. O campeonato pagou, segundo Scudeler, aproximadamente R$ 25 mil à federação local pela reserva e por outros serviços, como resgate, sinalização e cronometragem.
Se a tabela de preços mostra-se clara ao indicar os valores que devem ser cobrados para a realização de eventos esportivos nacionais e regionais, o presidente Senise faz uma interpretação diferente para enquadrar as provas no item 'evento sem fins lucrativos'. Para o dirigente, o que caracteriza o evento como sem fins lucrativos é "a entidade que está fazendo". "Se a entidade é sem fins lucrativos, logo o evento também é sem fins lucrativos."
Senise garante ter um parecer jurídico para tal interpretação e entende que até o Mundial de MotoGP se enquadraria nesse pensamento caso realize a prometida corrida no autódromo. "A federação é sem fins lucrativos. O Mundial de Moto, se eu estiver fazendo, continua sendo sem fins lucrativos, porque quem está fazendo é sem fins lucrativos", torna a dizer. "Infelizmente, a tabela dá as duas interpretações."
O presidente da FMDF compara a situação a um caso de direito do consumidor: "Se você chegar na loja e um produto tiver dois preços, você paga o menor", relaciona.
Rebatido com a informação de que a tabela trata de eventos sem fins lucrativos, não de entidades sem fins lucrativos, Senise hesita. "Eu estou sem a tabela aqui na mão. Mas eu sei que a interpretação de que o evento é feito por uma entidade sem fins lucrativos, ela não deixa de ser sem fins lucrativos", diz. "Agora, a interpretação que eu tenho aqui, eu já pedi parecer jurídico disso, entendeu? Você não é o primeiro que tem essa dúvida. Agora, a tabela poderia ser muito melhor feita. Não precisava disso."
E questionado se concordava com a classificação por ele feita sobre um evento que envolve montadoras e patrocinadores, Senise diz que não acha "nem certo nem errado". "A tabela é malfeita, só isso", repete.
Entre a disparidade de uma entidade sem fins lucrativos como a FMDF que recebe quase R$ 25 mil de um organizador de corrida e só repassa R$ 300 mais custos irrisórios à Secretaria de Esporte, a RWUp solicitou a Senise que discriminasse os gastos que tinha para realizar a corrida da Moto 1000 GP para saber do destino da taxa paga. O dirigente prometeu que mandaria por e-mail e por correspondência em 5 de novembro. Nada foi recebido pela reportagem.
A Moto 1000 GP retornaria a Brasília em 2013, mas cancelou a etapa após a morte da pilota Vanessa Daya. Dessa vez, de acordo com Scudeler, a reserva havia sido feita diretamente com a Secretaria do Esporte, sem passar pela FMDF.
O presidente da CBM (Confederação Brasileira de Motociclismo) logo mostra posicionamento diferente do mandatário da FMDF. "O evento pode gerar lucros a para a entidade, mas o lucro é usado para custear despesas administrativas da mesma – veículos, combustível, salários de funcionários, material de expediente, aluguel, água, luz, impostos diversos, usar esse benefício para enviar pilotos para participarem de provas em outro estado e até fora do país", relata Firmo Henrique Alves à RWUp, que salienta: "Não podemos confundir evento sem fins lucrativos com entidade sem fins lucrativos. São duas coisas completamente distintas.""A federação é sem fins lucrativos. O Mundial de Moto, se eu estiver fazendo, continua sendo sem fins lucrativos, porque quem está fazendo é sem fins lucrativos", alega Senise. (Foto: Arquivo Pessoal)Firmo também deixa claro que sua entidade é quem organiza e "a promotora é a Moto 1000 GP". "A federação local poderá ou não colaborar nos trabalhos de realização desse evento, contratando pessoas locais para trabalhar, prestando variados tipos de serviços e cobrando por isso", fala.
Questionado se a FMDF pode cobrar um valor diferente do estabelecido pela tabela promulgada pelo Governo do DF para competições esportivas nacionais e se existe algum tipo de controle por parte da CBM, Firmo aponta o problema da questão. "A Lei Pelé foi criada em 24 de março de 1998, por conta de uma briga do Pelé com o Ricardo Teixeira, e após essa data, o poder da entidade vem de baixo para cima. Cada entidade é soberana na administração financeira, mas ao contrário não", diz o presidente. "Por exemplo, a confederação presta contas à federação, mas o oposto é ilegal, entende? O Pelé mudou a lei que normatiza o sistema desportivo nacional e quem perdeu foi o esporte brasileiro. Hoje não temos poder nenhum sobre as entidades filiadas a nós, mas elas têm todo o poder."
Desta forma, a FMDF não presta contas à CBM de sua movimentação financeira.
E se tabelas de preços não falam a mesma língua, natural que surjam disparidades entre os fatos. Para Anderson, aquela proibição da Quarta Show por um tempo determinado nada tem a ver com drogas, nudismo & rap/funk: a suspensão se deu em função de uma divergência com o ex-presidente da Federação de Automobilismo do Distrito Federal (FADF). "Existia uma federação dentro do autódromo sob o comando do Napoleão Ribeiro, e os caras tentavam subornar a gente para que fizéssemos os eventos na pista. Sem pagamento, não deixavam a gente utilizar o espaço", explica.
Derson ainda acrescenta ainda os valores cobrados. "Eles cobravam R$ 15, 20 mil para fazer um evento em uma quarta-feira. O evento voltou a ser feito quando a fraude deles foi descoberta."
Questionada durante três meses sobre a determinação de um evento sem fins lucrativos, a Secretaria do Governo do DF diz por telefone que "recebeu a documentação da federação local" e que "não tem como função fiscalizar ou investigar" sua aplicação. Posteriormente por e-mail, volta a destacar que "o processo é montado com base na solicitação e documentação apresentadas pelo organizador do evento" e que "a Secretaria de Esporte não tem autonomia para fiscalizar documentações, pois não há repasse de verba do GDF ao organizador do evento".
O subsecretário de Administração dos Espaços Esportivos, Léo Vivas, foi procurado por telefone. Ao saber do assunto, o também pastor evangélico pediu que as questões fossem enviadas por e-mail para sua assessoria. O deputado eleito pelo estado do RJ não respondeu.
Depois das publicações das matérias anteriores da série 'DF-Dossiê de Falcatruas', Anderson Marques (Derson Racing) e Alan Ricardo (Capital Racing, organizadora do Campeonato Brasiliense de Motovelocidade, em que morreu Daya) evitaram atender à reportagem da RWUp para novos esclarecimentos.
O ditado é sábio ao dizer sobre quem se cala.Comentários
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quarta-feira, 20 de novembro de 2013
O que justificam os fins (lucrativos) FMDF ‘rebaixa’ eventos esportivos para repassar à Secretaria de Esporte do DF taxa mínima de uso do Autódromo de Brasília e não presta contas das movimentações financeiras (www.jornaldoautodromo.com.br)
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